A
VOLTA DE PATRUS
Anelito de Oliveira
Pensar
o que a candidatura Patrus Ananias a prefeito de Belo Horizonte significa exige
uma menção pontual à importância que Minas Gerais tem historicamente na cena
política brasileira. Do período colonial à contemporaneidade, a consistência do
jogo político nacional, aquilo que o tira do pólo das vaidades e o inscreve na
dimensão do eterno, passa pelo Estado. Num raio de mais de dois séculos, de
fins do setecentos até agora, a política do país se enriquece, indiscutivelmente,
com a contribuição pensada, equilibrada, dos mais autênticos políticos
mineiros.
Emergindo
da cidade de um dos grandes nomes da tradição política do Estado, a Bocaiúva de
José Maria Alkmin (1901/1974), Patrus Ananias é um depositário fiel dessa tradição
que a redimensiona, desde seus primeiros momentos nos anos 1980, a partir de um
permanente tensionamento de aspectos do nosso tempo, este “tempo de homens
partidos”, como Drummond escreveu n´A
rosa do povo, que é o século XX e, agora, século XXI. Um desses aspectos é
a negação da centralidade da vida humana na sociedade, que passou a ser tratada
como mais uma vida apenas, nada de mais.
A
percepção política de Patrus Ananias revela-se estruturada numa defesa generosa
da centralidade da vida humana, na contramão, portanto, de preceitos
hegemônicos, o que faz dela, inclusive, uma percepção fadada ao conflito com
aquela cultivada hoje pelos políticos em geral, meros serviçais do capital. O
fato – paradoxal, sem dúvida – é que o trajeto político de Patrus tem revelado
o quanto essa percepção está em consonância com a da maioria da população, não
só em Belo Horizonte, mas em toda Minas Gerais e pelo país afora, pessoas que o
veem como referência ideal de estar no mundo, como ser ético, que se
responsabiliza pelo outro.
Quem
elegeu Patrus vereador, prefeito e deputado federal e com ele esteve – nadando
contra uma maré difícil – na condição de candidato a vice-governador do Estado
em 2010, concorda com ele que a razão causal da política é o humano. E esse
humano não é, como querem enxergar os interessados maledicentes, uma categoria
abstrata, superada, encerrada no mundo das ideias, mas uma dimensão real,
estruturante, da realidade social. Essa dimensão precisa ser o parâmetro para a
operacionalização dessa realidade social em prol dos oprimidos, dos pobres,
tarefa capaz de dignificar a política.
Somente
uma década e meia (quase) de distância para nos dar a imagem cristalina,
digamos, do que foi a gestão Patrus Ananias à frente da prefeitura de Belo
Horizonte: foi uma gestão humanista, que tinha como princípio o desenvolvimento
humano. Havia um envolvimento espontâneo das pessoas com a gestão, uma
familiaridade – meio inacreditável – entre cidadãos e Prefeitura, como se
aquilo que cultivávamos – os ideólogos – pela vida como utopia tivesse, de
repente, virado realidade. Um Orçamento Participativo, uma Escola Plural, um
Festival Internacional de Arte Negra!
No
centro de tantas inovações, um prefeito humilde, capaz de falar a língua das
pessoas comuns, de se solidarizar com os outros, de se colocar como gente, com
todos os altos e baixos. Era realmente confortável ver ou saber de Patrus numa incansável
atitude dialógica, cuidadosa, atuando com um “coração inteligente”, diria
Hannah Arendt, sensível, no campo árido da práxis política, sempre em defesa de
uma cidade mais humana. Patrus, definitivamente, não foi mais um prefeito,
movido por interesses mesquinhos, mas “o” prefeito que uma cidade especial,
alicerçada no alumbramento, que é BH, merece.
Tal
foi o impacto positivo da gestão Patrus Ananias sobre todos nós que, movidos
por uma boa vontade muito mineira, sonhamos com o prefeito singular a serviço
das causas maiores do país. Demo-nos – moradores de Belo Horizonte em geral,
petistas e aliados em especial – ao luxo de prescindir de Patrus à frente da
prefeitura, movidos pela convicção, claro, de que, como está consagrado no
campo das artes, um grande artista não se repete. Apesar da nobreza da nossa
intenção, estávamos equivocados: Patrus não tinha concluído sua grande obra,
precisava de mais um mandato à frente da prefeitura de BH, Patrus ele-mesmo,
não apenas o PT.
Hoje,
dezesseis anos depois da gestão Patrus Ananias, é preciso grandeza de caráter
para dizer que Belo Horizonte se perdeu, ou voltou a se perder, tornou-se mais
uma metrópole a serviço do capital, uma cidade-produto dos banqueiros onde o
poder público, supostamente socialista, também coloca os interesses da maioria
das pessoas em segundo plano a fim de deixar o caminho livre para a ação
dos predadores situados nos maiores centros ocidentais. Patrus pensava e agia
sobre a cidade humanamente, o que não eliminava o dado econômico, claro. Os
sucessores de Patrus pensaram, agiam e agem sobre a cidade apenas
economicamente, e a partir de princípio econômico liberal – o que é pior.
A
volta de Patrus Ananias à luta pela prefeitura de Belo Horizonte não pode ser
encarada como fato qualquer, mas como “o” fato político das eleições deste ano
em Minas Gerais. O oposto de Patrus - não podemos nos enganar - não é Márcio
Lacerda, mas o projeto tucano hoje representado pelo governo Anastasia e
defendido “inocentemente” – uma lástima! – por Aécio Neves, num gritante
contraponto ao que Tancredo Neves realmente representou, projeto que percebe o
povo como mera mercadoria nas trocas econômicas. Belo Horizonte precisa de
Patrus agora, e Minas Gerais precisará muito mais dele, como representante de
um projeto popular e democrático para o Estado, em 2014.
Anelito
de Oliveira é doutor em letras pela USP, ex-editor do Suplemento Literário de
Minas Gerais, professor licenciado da Unimontes e pós-doutorando pela Unicamp.
Email: anelitodeoliveira@gmail.com