quarta-feira, 19 de novembro de 2008

Barack Obama - Aqui, a vitória negra não acabou em festa

Barack Obama

Aqui, a vitória negra não acabou em festa

Roquildes Ramos Silveira *

Barack Hussein Obama, 44º Presidente eleito para governar os Estados Unidos. Quem de nós ainda duvida de sua origem negra? Pois é, ele é o primeiro negro na história dessa nação a ocupar o cargo mais importante para o mundo. A Presidência dos Estados Unidos.

O mundo está festejando, e nós o que estamos fazendo? Vários países, principalmente, do continente da África, estão em festa comemorando esse fato histórico, pois, no campo da simbologia reacende possibilidades propositivas para a humanidade, contrário, portanto ao autoritarismo político, econômico e militar, marcas impositivas de governabilidade entre os Estados Unidos e o restante do mundo.

E para nós brasileiros (negros e negras) que importância tem para a nossa nação a eleição de Barack Hussein Obama, em que aspecto será para nós positiva? Esta resposta, analisando todos os ângulos e dimensão, não deverá ser manifestada de forma apressada, logo, inconseqüente, haja vista que no Brasil, apesar do seu recente fortalecimento econômico, ainda, é um país considerado emergente em desenvolvimento e dependente das políticas econômicas Estadunidenses. Contudo, não há como negar que o fato em si representa um acontecimento extraordinário, acalentando a esperança do respeito aos Direitos Humanos, ente outros Direitos e Garantias Fundamentais, e a Soberania das demais nações.

Aqui entre nós, que durante muito tempo vivemos numa condição legitimada de escravidão, que ainda hoje assiste a perpetuação dos efeitos dessa escravidão é um choque acreditar que um dia isso fosse possível, pois, ao contrário desse acontecimento histórico, o Brasil está longe de ser uma possibilidade real de acessão no mundo da política, da economia, quanto mais um negro vir a chegar à Presidência da República.

Na verdade, as condições para a população negra em geral são péssimas (com ressalva as conquistas pessoais). Sendo assim, os negros e negras brasileiras raramente ocupam e ocuparão um espaço na classe privilegiada do Poder, seja na administração pública ou privada. Em pleno século XXI, no Brasil a condição da população negra se restringe ao patrimônio maldito herdado da escravidão. Vivemos na extrema pobreza, no "mercado informal" (a mendicância, a prostituição, a exploração infantil, o emprego desqualificado etc), além disso, nos é imposto pelo neoliberalismo (com fachada de esquerda) uma estrutura educacional degenerada com o objetivo maior (não declarado) de perpetuar o analfabetismo e, conseqüentemente, a marginalização da raça. Este sistema nos impõe como políticas públicas habitacionais as cadeias e penitenciárias (para os jovens e adultos), os asilos (para os velhos), os orfanatos (para as crianças), os manicômios (para os desajustados) tem sido os nossos lugar; construções da modernidade para o controle demográfico do excedente de cor. Conclui-se que apesar de todo avanço alcançado, digo, a "democracia", os descendentes privilegiados da colonização brasileira ainda vêem os desdentes da escravidão como espúrias necessárias para a acumulação de riquezas.

Diante dessa realidade, precisamos refletir amiúde acerca do futuro do Brasil porque é o segundo maior país em população negra do mundo e vivemos, com algumas mudanças aparentes, no que concerne a nossa estética e cultura, como no dia seguinte da "Abolição", sem Poder. As favelas a cada dia se multiplicam, os números de negros e negras sobrevivendo da criminalidade e da prostituição tem aumentado geograficamente. Tal situação não é diferente no governo da "Bahia de Todos Nós". A cada momento vê-se essa consolidação do modelo opressor e degenerativo de grande parte de nossa população sem que nada de concreto seja implementado, a não ser o discurso em nome da "governabilidade", leia-se, deixar tudo como está para não contrariar os interesses econômicos das elites.

O atual Governo não se diferencia dos outros governantes de outrora, pois, como se tem visto não existe proposta séria para a educação pública, nem para a saúde (apesar dos avanços tímidos), tampouco para a economia e o combate ao desemprego que, segundo dados estatísticos, afetam diretamente a condição humana da população negra.

Nota-se então que os negros e negras sempre tiveram um lugar que lhe é reservado (por isso, no modelo atual capitalista nunca estivemos excluídos, ao revés), qual seja, rir, segurar a bandeira da esquerda e aplaudir os governantes, entre tantas outras funções que temos executado para ganhamos o pão de cada dia. Fora isso, quantos dos que "comeram poeira" junto com o atual Governador foram chamados para ocupar postos de destaques e de confiança?

Sendo assim, em que medida podemos afirmar que a vitória do negro Barack é nossa vitória? Infelizmente, muito pouco. A repercussão parece ter sido tímida. A prova disso, que por não estarmos organizados política e economicamente não saímos para comemorar. As nossas ruas não foram ocupadas pelos blocos, nem pelo frevo, muito menos, o sambódromo anunciou a festa que o nosso Planeta preparou para o nosso Povo, nem mesmo os Terreiros de culto Afro rufaram seus tambores dando as boas novas. Enquanto isso, Barack Hussein Obama triunfantemente "fez" com que povos diversos saíssem às ruas celebrando, se abraçando e chorando de felicidade.

A forte influência das teorias marxistas, entre outras, que ajudaram a fundar as bases ideológicas dos movimentos sociais, na América Latina na formação de algumas lideranças do movimento negro, talvez, seja uma das explicações para a nossa tímida reação. Historicamente aprendemos que para sermos conscientes devemos negar tudo que seja produzido pela "América", portanto, tendemos a fazer uma analise de que os negros dos Estados Unidos são tão-somente capitalistas e, não são diferentes de tantos outros.

Então se entende porque não estamos em festa, porque sem poder político e econômico, o que nos resta como possibilidade é ser atores coadjuvantes, figurantes no "teatro" do "Brasil de Todos" e na "Bahia de Todos Nós". Importante lembrar que recentemente saímos de uma eleição e poucos, entre nós, votamos num candidato para vereador ou vereadora por serem negros (e ainda assim, nos orgulhamos da nossa pele, do nosso cabelo e da nossa consciência).

Para que um dia seja possível viver a possibilidade real e concreta de construímos um projeto revolucionário e libertário para o povo negro e para a nossa sociedade, é preciso que nós negros e negras nos unamos e tomemos em nossas mãos a responsabilidade de materializar este projeto, pois, para que o sonho de Martin Luther King se tornasse possível foi necessário muito mais que cotas (indispensáveis ainda entre nós). Fora a determinação de um povo, revestida de muita disciplina que fez do sonho dele, entre tantos outros, como Malcolm X, que incansavelmente lutaram dando a própria vida para que um dia os direitos políticos e econômicos tivessem ao alcance de todos.

Precisamos refletir que herança estamos semeando, pensar nas futuras gerações. É preciso mudar. Deixar de colher e acolher as "migalhas" do banquete dos poderosos.

Estudante de Direito – Para a Disciplina de Direito Econômico. Prof. Deraldo Dias. Coordenador Geral do Sindicato dos Servidores Penitenciários da Bahia e do Núcleo Makota Veldina de Estudantes Negros da UCsal.

ogumder@hotmail.com

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